quinta-feira, 26 de julho de 2012

Murphy


Chegou em casa mais tarde do que de costume e viu que estava sem as chaves. Lei de Murphy. Todos estavam dormindo. A dor nos rins aumentava cada vez mais. Tocou a campainha duas vezes e nada. Desabou a chuva. Sem bateria no celular, teve que caminhar até um telefone público. A irmã só resmungou um “está aberto”. Entrando, percebeu que aquela dor que sentira era apenas reflexo da forte ligação que tinha com Ana que encontrava-se sentada no chão, ao lado do telefone, com os joelhos juntos ao peito. Sabia exatamente o que ela sentia. Em suas devidas proporções, sempre sabia. Aos gritos acordou os pais, pois a chave do carro não estava no lugar. Não dava tempo de esperar por uma ambulância, a dor era quase insuportável. O pai, apenas pelo fato de saber que não o deixariam mais dormir, carregou Ana até o carro, sem muito cuidado, e dirigiu até o hospital. Vitória segurou a mão da irmã por todo o caminho, sem ouvir choro, nem palavra alguma. Não era necessário. Ela sabia o que Ana sentia.
O sol ainda nem havia aparecido quando deixou o hospital. Já estava a par do estado da irmã: uma cirurgia simples para remover um cálculo renal. Já na frente do escritório onde trabalhava, aconteceu aquela cena típica de um dia de azar. Um ônibus passou em uma poça d’água, sujando de barro sua roupa. Era inacreditável que no outro dia, tudo ainda desse errado. Lei de Murphy, lembrou.
Sua carta de demissão estava pronta em cima da mesa. Sorriu irônica. Pegou-a e sem falar com ninguém, saiu do prédio. Freada brusca. Deitada ali no chão, ao mesmo tempo em que o médico discava para lhe contar da complicação que ocorrera na cirurgia da irmã, Vitória perdeu os sentidos e Ana também.
2009 

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